O significado de escala, em termos arquitetônicos e urbanísticos, está relacionado à técnica empregada na redução de dimensões, proporcionalmente aos dimensionamentos reais. Isto inclui os dimensionamentos totais e parciais de uma edificação e dos elementos urbanos.
Por humano entendemos, basicamente, os atributos daquilo que objetiva garantir a existência do homem, não apenas em termos de sobrevivência, mas também da qualidade dos elementos disponíveis no sentido de conceder os necessários meios à manutenção de seu bem-estar.
O significado de bem-estar associa-se às diversas dimensões do ser humano. Considerada a extrema complexidade de cada homem, isoladamente e no seu conjunto, cito algumas destas múltiplas faces: a física, a psicoemocional, a social e a psico-social, a econômica e a política, sem alijar a dimensão estética, decorrente dos fatores mencionados, e, dos diferentes modos de ver e relacionar-se com o mundo objetivo, percepção decorrente das experiências cultural e educacional. Esta última, relacionada não apenas à educação no âmbito informativo, mas também nos aspectos formativos, resultado das interações entre o homem e seu ambiente.
A partir deste contexto, especificamente no âmbito arquitetônico e urbanístico, o termo escala humana assume um complexo significado, de conteúdo antropomórfico. Estabelecer as bases do que poderia ser considerado como de escala humana requer a compreensão da forma do homem interagir com o mundo em cada momento de sua história, consideradas as diferentes percepções do “eu” e do “nós”, variáveis de acordo com o período e o lugar onde está inserido.
Da Grécia dos templos em honra aos Deuses, vem o exemplo do que o homem daquela época e lugar percebia sobre si mesmo e sobre os demais. Construções monumentais, gigantescas, relegavam as pessoas a um plano reduzido, minúsculo, que traduzia a sua pequenez e desimportância em relação ao patrono do templo – o Deus – e, aos sacerdotes, os intermediários entre o Céu a Terra.
Muito mais que a intenção em abater o ego, a grandiosidade do templo expressava a subordinação de toda a sociedade aos princípios e normas estabelecidas. A democracia tinha seus senões. Era possível questionar, desde que não se referisse ao templo e a seus gastos exorbitantes. Esta, a escala humana daquele período.
Não à toa os cidadãos atenienses prosperaram tão intensamente nas atividades do espírito – filosofia, artes e história – e os espartanos nas atividades do corpo – capacitação física e guerreira. Provavelmente, este desenvolvimento fosse uma reação no sentido de superar a pequenez a que eram obrigatoriamente relegados.
Depois, vieram as grandes catedrais, com suas abóbadas gigantescas e torres apontando para o céu. Outra forma de subjugar as massas e as individualidades, em nada diferente da intenção dos templos gregos. Fosse um rei ou o menor dos plebeus, todos se subordinavam ao imenso poder da Igreja, controlada pelos senhores da vida e da morte.
Em ambos os períodos históricos, o contraste entre estas enormes construções e o casario urbano era proposital. Mas o poder político, financeiro e social de alguns permitia que suas casas fossem diferenciadas em termos de programa arquitetônico, de forma a influenciar o imaginário da massa. Eram os palácios reais e as casas dos bem-nascidos funcionários do Estado. Não é de se estranhar que a queda em desgraça de um destes nobres implicasse, imediatamente, na perda de suas posses, o que incluía a tomada da faustosa moradia. A escala humana onde o desobediente era instalado esvaia-se com o seu grau de insubordinação.
Hoje, a perspectiva mudou um pouco. Os palácios já não representam a fonte absoluta do Poder, pelo menos nos Países com um certo nível de democratização. Morar numa destas edificações já não significa ser ungido por Deuses, em detrimento dos demais. A moradia é temporária, dependente do voto, exceto no caso de ditadores inescrupulosos.
Muito curiosa, entretanto, é a mudança no modo de morar da população.
Os casarios uniformes são, gradativamente, substituídos por edificações de apartamentos. Mas isto nas áreas de maior por aquisitivo. Digamos que o casaria baixo se verticalizou. As residências se sobrepuseram, compondo edificações altamente densas, dos pontos de vista da área total construída e da quantidade de unidades residenciais presentes, e conseqüentemente número de habitantes locais e no conjunto dos núcleos urbanos.
Sem entrar no mérito desta questão, sob os pontos de vista dos problemas resultantes da necessidade de prover ou ampliar os equipamentos públicos e urbanos – escolas, hospitais, transportes públicos, sistemas viários, sistemas de abastecimentos de água e esgotamento sanitário, energia, coleta, transporte e tratamento de resíduos sólidos – queremos apenas tecer analogias relativamente ao significado destas estruturas arquitetônicas e urbanas dentro do contexto do homem e seu meio ambiente construído, sob a perspectiva do seu lugar e espaço, a nova escala humana.
A ressurreição de um grego do período clássico, ou de um construtor de igrejas góticas representaria, para eles, uma nova passagem carregada de conflitos de natureza simbólica.
O que seriam aqueles enormes edifícios, ocupados por inúmeros habitantes? A que Deus serviriam? Como o Deus permitiria (através de seus intérpretes devidamente investidos) que o homem, em sua pequenez, morasse junto a ele, em alturas nunca antes experimentadas pelas construções clássicas? Ou como aquelas imensas torres apontando para o céu podem conter homens, em vez de apenas ponteiras furando o éter?
Mas ainda há coisa pior. O insignificante ser já não caminha pelo solo em direção ao amplo salão, ou nave, onde recebe a orientação religiosa. Agora ele desce da torre, como um Deus, e ocupa as áreas do térreo, agora destinadas a lazer, com piscinas, salões de jogos, restaurantes, salas de projeção, pistas de corrida e academias.
Acredito que esta talvez seja uma espécie de influência subliminar que impele o homem a aceitar o convívio com vários outros, de forma nem sempre pacífica, restrito a apartamentos de dimensões quase sempre econômicas (inferiores aos padrões de dimensionamentos das unidades habitacionais não econômicas). Curiosamente, é muito intensa a procura pelos apartamentos localizados nos níveis mais altos da edificação, em geral mais caros que os localizados nos pavimentos mais baixos.
Afirmar que a vista é melhor lá em cima representa apenas uma parte da questão, situada no âmbito da consciência objetiva. Na verdade, existe um forte indício de que o homem quer se sentir maior, mais alto, mais valorizado. E sentir-se importante por morar em núcleo urbano economicamente significativo, que pode observar bem do alto, ultrapassando qualquer Deus do Olimpo (monte que também domina a paisagem urbana).
Se estas reflexões carregam algo verdadeiro, ou não, deixo aos filósofos e psicólogos a tarefa de distinguir. Não cabe a uma arquiteta tecer análise mais profunda sobre o tema, a escala humana, sob os aspectos do significado e influências do ego e da história.
terça-feira, 1 de março de 2011
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