O PDL do Guará (Lei Complementar 733/2006) não definiu, a priori, as alturas máximas obrigatórias das edificações e os afastamentos mínimos obrigatórios para os lotes localizados na Região Administrativa. Contudo, vinculou estes dois parâmetros através de fórmulas específicas, relacionadas a três critérios:
A. Afastamento mínimo obrigatório entre a fachada da edificação e o meio-fio oposto da Via Pública de acesso:
1. Fórmula adotada: af = h – 5 – d
Tg60º
Onde:
· h = altura da fachada da edificação
· tg60º = 1,73
· distância entre a divisa do lote e o meio-fio oposto
B. Afastamento mínimo obrigatório entre a fachada da edificação e a divisa compartilhada com lote vizinho, desde que a referida fachada apresente vãos de iluminação e ventilação:
1. Fórmula adotada: af = 1,5 + b + 0,25 (n – 1)
Onde:
· b = 4 (Coeficiente de ajuste aplicável no Guará)
· n = Número total de pavimentos da edificação
C. Afastamento mínimo obrigatório entre edificações existentes no mesmo lote, com paredes confrontantes, quando pelo menos uma das edificações apresentar vãos de iluminação e ventilação:
1. Para 1º, 2º e 3º pavimentos – mínimo de 3m
2. Para o 4º pavimento em diante:
Fórmula adotada: af = 3 + 0,25 (n – 1)
Onde:
· n = Número específico do pavimento da edificação (cálculo feito para cada pavimento)
A partir destes parâmetros, poderíamos supor que as edificações, a partir do PDL, poderiam ter alturas compatíveis com as características pré-existentes do Guará, de linhas predominantemente horizontais, em situação que respeitasse os habitantes deste Núcleo Urbano sob os aspectos culturais e funcionais. Ou seja, as novas edificações não provocariam impactos negativos sobre a população, acostumada à horizontalidade do seu meio, ao mesmo tempo em que os investimentos em equipamentos públicos urbanos e comunitários – novas vias de circulação de veículos, aprimoramento dos sistemas de água, energia, esgoto, pluviais e outros, construção de novos Hospitais, Escolas, Delegacias e outras edificações com atividades a serviço da população resultaria em seu benefício. Enfim, poderia ocorrer o adensamento populacional sem traumas para seus habitantes.
Lamentavelmente, como veremos a seguir, alguns fatores técnicos não foram devidamente considerados na definição dos parâmetros urbanísticos definidos pelo PDL. A aplicação das fórmulas já mencionadas desconsiderou quatro importantes componentes:
A. As vias do Guará são consideravelmente largas, portanto, a aplicação da fórmula que determina a obrigatoriedade de afastamento é inócua.
B. A definição do afastamento não considera a altura da edificação como um todo, em qualquer de seus pontos, mas apenas a altura da fachada especificamente voltada para a via de acesso.
C. Os afastamentos laterais, em relação aos lotes vizinhos vinculam-se, apenas, à existência de janelas existentes naquela fachada. Se não houver janela, seja qual for à altura da edificação, pode estar situada sobre estas divisas.
D. O afastamento em relação às fachadas de edificações diferentes, dentro do mesmo lote, em que haja paredes confrontantes das edificações com janelas em pelo menos uma delas, resulta em afastamento absolutamente incompatível com as condições mínimas de privacidade.
Para que seja observado um afastamento adequado, de pelo menos 20m, como ocorre, por norma, em edificações destinadas à Habitação Coletiva nas quadras do Plano Piloto, será necessário a existência de, no mínimo, 69 Pavimentos, implicando em edificação de mais de 207m de altura. Para as edificações mais altas do Guará, localizadas na Via de Contorno, a altura não supera 75m, circunstância em que o número de pavimentos não ultrapassa 25.
A análise das condições estabelecidas para o afastamento mínimo em relação à via de acesso ao lote requereu um estudo de toda a Região Administrativa em termos de dimensionamento das referidas vias. A seguir relatamos:
* Para efeito deste estudo, H corresponde à altura da edificação e d corresponde à distância entre o limite do lote e o meio-fio oposto da via de acesso.
* As larguras das vias foram obtidas a partir das plantas oficiais de urbanismo.
I. Guará I
1. Via Central:
d = 24m
Conclusão: O afastamento obrigatório só começa a ocorrer para alturas de edificações superiores a 46,52m, quando o resultado da aplicação da fórmula for maior que zero.
2. Via Central, à frente do Terminal Rodoviário:
d = 17m
h > 34,41m
3. Via de Acesso Internas às QEs e QIs:
d = 12m
h > 25,76m
II. Guará II
1. Via de Contorno:
d = 40m
h > 74,20m
2. Via Central:
d = 29m
h > 55,17m
* Obs: A despeito da possibilidade de construir edificações com mais de 18 Pavimentos, o Decreto nº 29848/2008, Art. 2º fixou as alturas máximas em 36m, o que resultou na redução do número máximo de pavimentos para 12.
3. Via de Acesso às QEs:
d = 16m
h > 32,68m
4. Vias Internas aos Conjuntos:
d = 12m
h > 25,76m
5. Vias com estacionamentos internas aos Conjuntos:
d = 12m
h > 25,76m
6. Via que contornam os Centros Comunais e EPCs, contínuas em relação a Via Central
d = 10,5m
h > 23,165m
7. Vias paralelas à Via Central e paralelas aos lotes dos conjuntos mais próximos a esta via:
d = 13,5m
h > 28,355m
8. Vias localizadas entre os lotes das QIs e os conjuntos das QEs
d = 29,5m
h > 56,035m
III. QE 38
1. Via de Acesso aos Conjuntos:
d = 12m
h > 25,76m
2. Vias de acesso e paralelas às Áreas Especiais 01 a 07 e aos Blocos “C” e “D”:
d = 12m
h > 25,76m
IV. QEs 42 e 44
1. Vias de acesso aos Conjuntos:
d = 19m d = 16m
h > 37,87m h = 32,68m
V. QE 46
1. Todas as Vias:
d = 11m
h > 24,03m
VI. QE 40
1. Vias sem estacionamento:
d = 17m
h > 34,41m
2. Vias com estacionamentos:
d = 23m
h > 44,79m
VII. SMAS
A. Lote “B” (Carrefour):
1. Via EPIA:
d = 241,85n
h > 423,40m
2. Via de Acesso aos Estádios
d = 74m
h > 133,02m
B. Lote “C” (Pelezão):
1. Via EPIA:
d = 241,85n
h > 423,40m
2. Via de Acesso aos Estádios
d = 74m
h > 133,02m
C. Lote “A”:
1. Via EPIA:
d = 241,85n
h > 423,40m
2. Via de Acesso aos Estádios
d = 74m
h > 133,02m
D. Lote 6580 (Park Shopp):
1. Em relação à EPIA:
d = 65n
h > 117,45m
2. Em relação à Pista de Contorno Oeste:
d = 40m
h > 74,20m
VIII. SOF/SUL
1. Travessas 01 a 15:
d = 26m
h > 49,98m
2. Vias SOF – 3 e SOF – 4:
d = 50m
h > 91,50m
3. Vias SOF – 1:
d = 40m
h > 74,20m
IX. SGCV
1. Vias GCV:
d = 50m
h > 91,50m
2. Vias de acesso aos Estádios:
d = 21m
h > 41,33m
Em relação aos SMAS, SOF/SUL e SGCV, a despeito das excessivas alturas resultantes da aplicação da Fórmula, suficientes para edificar com número de pavimentos superior a Cem, a proximidade entre estes setores e a área tombada, cuja Poligonal se desenvolve sobre a EPIA, determinou a revisão das absurdas possibilidades, e o Decreto nº 29484/2008, Art. 1º fixou as alturas máximas em 34m.
X. QELC
1. Vias de acesso às Projeções (Habitações Coletivas):
d = 7m d = 10m d = 18,21m
h > 17,11m h = 22,3m h = 36,5033m
2. Vias de acesso aos lotes das Entrequadras:
d = 13m d = 11,37m
h > 27,49m h = 24,67m
3. Vias de acesso aos lotes frontais das QELCs:
d = 15,215m d = 14,886m
h > 31,3219m h = 30,75278m
d = 14m d = 11m
h > 29,22m h = 24,03m
XI. VILA TECNOLÓGICA
1. Via Interna:
d = 12m
h > 25,76m
2. Vias de Contorno das QELC:
d = 12m d = 13,50m d = 19,50m
h > 25,76m h = 28,355m h = 38,735m
A estranha impressão que nos fica, diante deste agigantamento das edificações no Guará, é de que muitas características locais não foram devidamente consideradas.
Nos parece que não foram levadas em consideração a generosa largura das vias e o arraigado hábito da população de visualizar o horizonte, enquanto fator que serve de linha fundamental no Distrito Federal, instalado pelo princípio urbanístico definido por Lúcio Costa para o Plano Piloto de Brasília.
As justificativas para os extraordinários acréscimos nos potenciais construtivos do Guará são: basicamente:
· A condição de centralidade da Região Administrativa em relação às cidades do Trecho Sul do DF e Plano Piloto.
· A carência habitacional como fator preponderante para o adensamento não só no Guará, mas de todo o território do Distrito Federal, conforme dados contidos no PDOT.
Contudo, pelo que verificamos em temos de preços praticados, os imóveis em construção na RA – X em nada contribuirão com a necessidade de reduzir o déficit habitacional, sobretudo se considerarmos a contínua elevação do valor do metro quadrado da terra – este, sim fator que induziu o interesse empresarial pela Região Administrativa do Guará.
Curiosamente, a maioria das Unidades Domiciliares projetadas é caracterizada como apartamento econômico, onde a área útil não ultrapassa a 68m², ou mesmo apartamentos conjugados (no máximo 40m² de área útil) e dimensões dos compartimentos inferiores às exigidas para apartamentos não econômicos a despeito dos pequenos espaços individuais, as áreas de uso comum destas edificações são generosas, aproveitando os indisciplinados limites de altura para a criação de torres implantadas sobre pequenas parcelas de lote, garantindo a liberação do térreo, então destinado a múltiplas atividades de lazer (piscinas, cantinas, academias, SPA e outros), como atrativo para a comercialização de apartamentos diminutos.
Em decorrência de todo este processo devidamente autorizado pelos instrumentos legais – apartamento econômico e o conjugado não são mais restritos à construção em áreas pré-determinadas como o foram no passado; não existe impedimento para a duplicidade de tratamento da mesma área onde a unidade domicilial econômica ou a conjugada podem convier com sofisticados serviços de lazer e com apartamentos não econômicos; a altura descontrolada das edificações permitem a verticalização em torres densamente ocupadas por inúmeras unidades de área úteis diminutas; o mecanismo da incorporação de varandas à área interna dos apartamentos favorece o crescimento da unidade, quando a unidade econômica pode ser bem mais cara – jamais haverá o verdadeiro atendimentos à redução do déficit habitacional. As unidades permanecerão sendo adquiridas por aqueles cuja capacidade financeira não os enquadra na estatística da carência habitacional, e os apartamentos permanecerão sendo alugados, perpetuando a mesma carência utilizada como mote para adensamento construtivo.