terça-feira, 28 de julho de 2015

História das Habitações Individuais no Distrito Federal

      
                Nos primeiros momentos, ainda na década de 1950, na delimitação do quadrilátero que abrigou o Distrito Federal apenas dois núcleos urbanos pontuavam o espaço definido – Brazlândia e Planaltina.
                Brazlândia, datada de 5/06/1933, existia há 27 anos. Planaltina, por convenção, fundada em 19/08/1859 – não é conhecida a data precisa de sua instalação – contava, então, com 101 anos.
                Planaltina restringia-se à área hoje denominada de centro histórico. De configuração típica de muitas cidades históricas brasileiras, uma praça central dominada pela construção destinada à igreja representa o núcleo de irradiação de ruas margeadas por casario geminado, com janelas que se abrem diretamente sobre o passeio público.
                Os lotes possuem dimensões consideráveis – cerca de 500m² - e as habitações unifamiliares foram implantadas no trecho frontal destas áreas, liberando grande parte dos lotes para quintais, ainda hoje, em muitos casos, ocupados por árvores.
                Da mesma forma que Planaltina, Brazlândia, fundada na década de 1930, tem sua área mais antiga ocupada por lotes com características compatíveis com o seu período de ocupação, época em que os lotes residenciais unifamiliares apresentavam dimensões mais generosas.
                O fundamento da implantação de grandes lotes, procedimento culturalmente arraigado às antigas ocupações urbanas brasileiras, associa-se a uma interligação entre as áreas urbanas e os costumes e modos de vida rurais, quando as atividades urbanas se integravam às rurais, espelhando-se nos grandes espaços do campo.   
                Na época de construção do Plano Piloto de Brasília, na década de 1950, impunha-se a necessidade de abrigar as pessoas envolvidas nas obras, além de suas próprias famílias e muitos outros que migravam para o Distrito Federal em busca de melhores condições de vida.
                Com este objetivo foi criado o Núcleo Bandeirante e os acampamentos das construtoras, todos nas imediações do Plano Piloto, especialmente as Vilas Planalto e Metropolitana.
                Todas as residências destas áreas, dotadas de compartimentos com áreas satisfatórias, foram edificadas em madeira trabalhada, sempre em tábuas justapostas horizontalmente, em lotes de dimensões generosas.
                Curiosamente, no Núcleo Bandeirante foram construídas residências de madeira, mas com dois pavimentos, em modelo único que se repetia pela área urbana.
                As residências do Núcleo Bandeirante, daquela época, foram substituídas por obras em alvenaria, assim desaparecendo aquele interessante modelo. Mas parte considerável da Vila Planalto manteve-se intacta, acertadamente tombada como patrimônio histórico, garantindo a sua representatividade.
                O projeto urbanístico original do Plano Piloto previa, exclusivamente, a construção de edifícios residenciais coletivos, contidos nas Superquadras, restritos às Asas Norte e Sul. Não havia previsão de residência unifamiliar dentro dos limites de Brasília.
                Contudo, já no início da implantação da cidade, as faixas ocupadas pelas quadras 700 Norte e Sul tiveram a sua destinação alterada. O Relatório do Plano Piloto de Brasília previa, para aquela localização, a ocupação com atividades de natureza rural, inclusive armazenamento, objetivando suprir as necessidades do Plano Piloto. Mas, já em 1960, as residências unifamiliares estavam construídas, pelo menos as localizadas nas quadras iniciais e finais das 700 Sul.
                Estas habitações unifamiliares foram concebidas como edificações geminadas, com um só pavimento (térreo), em lotes com cerca de 100m² e taxa de ocupação de quase sua totalidade, exceto pela obrigatoriedade de manter uma abertura (aproximadamente de oito por cento do lote) na face superior para iluminação e ventilação. As edificações assim construídas dispunham de 3 a 4 quartos, com cerca de 10m² cada.
                Posteriormente, entre o final da década de 1980 e início de 1990, foi permitida a construção de 2 pavimentos, à semelhança do que já havia sido inicialmente proposto para as quadras iniciais da W/3 Sul, àquela época denominadas como HP3 .
                Com o passar dos anos, a ocupação dos núcleos urbanos já existentes foi sendo intensificada, ao mesmo tempo em que outros núcleos eram criados. Afinal, tanto os apartamentos das superquadras, quanto as residências das quadras 700, eram destinados a servidores públicos, civis e militares – que não eram os proprietários, mas pagavam ao governo federal uma taxa de ocupação. Apenas a partir do final da década de 1960 as unidades passaram a ser vendidas a seus ocupantes (preferencialmente).
                O controle de todas as áreas do Distrito Federal, desde a sua inauguração, foi atribuição do Governo do Distrito Federal. Inicialmente através da NOVACAP e, posteriormente, da TERRACAP, empresa criada com este objetivo específico.
                Além deste necessário controle de terras, que perdura até a atualidade, lei federal específica, anterior a 1960, proíbe a subdivisão de lotes no Distrito Federal. Exceto se uma lei urbanística dispuser em contrário, após a observância estrita à localidade do lote. Em decorrência, ocupar um mesmo lote com duas ou mais residências é proibido.

                Mas, mesmo assim, muitos lotes no Distrito Federal padecem de problemas graves pela sobreposição de unidades residenciais. Em consequência, em seu conjunto pressionam os sistemas de fornecimento de serviços públicos, de estacionamentos para veículos, de coleta de resíduos e de esgotamento sanitário, certamente apontando para um futuro indesejavelmente caótico. 

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Breve História das Alterações de Normas Urbanísticas e Construtivas no Distrito Federal.


            O ato de alterar uma norma, urbanística ou arquitetônica, implica em uma série de procedimentos, sobretudo de análise dessa possibilidade submetida à ótica dos aspectos positivos e negativos envolvidos na sua aplicação, desde o seu surgimento, e a previsão das consequências posteriores à intervenção.
            Se determinada norma é alterada, saiba-se que exaustivo processo analítico foi envolvido na decisão final. Postura muito alheia, portanto, a qualquer ótica parcial para benefícios individuais ou de grupos.
            O procedimento analítico inclui o histórico da aplicação de cada norma, no tempo e espaço – as razões de seu surgimento, verificadas dentro do universo dos condicionantes temporais e locais, variáveis com as características do modo de vida e de apreensão do espaço pela coletividade.
            Ao mesmo tempo, verificam-se as consequências da alteração do instrumento legal – que benefícios ou malefícios poderão resultar e como aquela mudança poderá ser feita de modo a respeitar a interação entre a coletividade e seu ambiente, tanto no contexto urbano, quanto das edificações.
            Na história do Distrito Federal, sob o ponto de vista da legislação urbanística e arquitetônica, muitas alterações foram introduzidas no decorrer dos 55 anos de criação deste conjunto de núcleos urbanos.
            Sob o aspecto urbanístico, as alterações ocorreram por razões bem específicas:
1.     As necessidades impostas pelo adensamento urbano, exigindo a criação de mais áreas residenciais e, por conseguinte, novas áreas de apoio ou complementares a estas ocupações – embora, muitas vezes, a criação de novas áreas  residenciais tenha sido proposta por razões outras que não o atrelamento à demanda interna verificada.
2.     Alterações impostas pela própria dinâmica urbana de cada núcleo, exigindo maior complexidade no nível crescente de serviços necessários.
3.     Maior integração entre os núcleos urbanos vizinhos já modificados ou em processo de modificação.
                        Do ponto de vista arquitetônico, várias alterações foram introduzidas desde o primeiro Código de Edificações (1982), sobretudo nas décadas de 1970 a 1990.
                        O Plano Piloto e as cidades circunvizinhas surgiram de intervenções urbanísticas, ou seja, foram criadas – exceto os núcleos preexistentes de Planaltina e  Brazlândia.
                       Em consequência, muitos ajustes se fizeram necessários no decorrer do tempo, como forma de adequação dos novos objetos arquitetônicos. Especialmente as edificações residenciais coletivas que compõe as superquadras do Plano Piloto, por representarem uma experiência inovadora, exigiram abordagens capazes de acompanharem a sua própria evolução.
                        Muitos acertos foram conquistados neste processo de modificação e adequação:
1.     A transformação do comércio localizado entre as superquadras, de local, como queria o Relatório do Plano Piloto de Brasília, para atividades de natureza urbana, considerada a dinâmica desenvolvida pela população usuária, certamente representou um grande acerto, apesar dos problemas que perduram até os dias atuais, como a insuficiência de vagas para estacionamento de veículos e os acréscimos construtivos sobre área pública.
2.     A construção de embasamentos nas edificações do Setor Hoteleiro Sul, permitindo a oferta de comércio e serviços complementares à atividade de hospedagem.
3.     A permissão para construir dois pavimentos nas edificações residenciais unifamiliares localizadas nas quadras 700 norte e sul aproximou as alturas das residências em relação às verificadas nas edificações comerciais ao longo das vias W/3 norte e sul e do SEPN/S. Apesar do acerto, as grandes dimensões dos lotes residenciais permitiram a especulação de alguns proprietários que subdividiram a edificação em duas ou mais residências, em certos casos transformando-as em pensões.
           
            Mas alguns equívocos foram cometidos na trajetória das modificações.
            Um dos mais graves foi o Plano Diretor do Guará (2006), felizmente julgado inconstitucional em muitos de seus artigos. Em consequência, foi inviabilizado como instrumento para a análise de projetos.
            O Plano Diretor do Guará foi muito mais uma triste colcha de retalhos normativos a servir interesses diversos do que um orientador urbano. Não tinha unidade para abordagem do contexto urbanístico.
            Outro equívoco igualmente absurdo, este associado a edificações, foi a eliminação da obrigatoriedade de haver janelas para a ventilação natural de banheiros em edificações de atividades coletivas, permitindo a utilização exclusiva de mecanismos elétricos para suprir a ausência de janela.  
            Em consequência, nos dias atuais, quando a energia elétrica  é cara e rara o suficiente para inibir soluções de utilização de dispositivos artificiais em substituição  à ventilação natural – antes propiciada pelos prismas – podemos reafirmar o absurdo da decisão.
            Atualmente, não faltam corretores de imóveis que ofereçam unidades mais caras apenas porque dispõe de janelas nos banheiros. O equívoco transformou-se em instrumento de barganha.

            Diante de ingerências tão graves, espera-se que nos períodos atuais e futuros, quando a complexidade urbana e os desafios arquitetônicos crescem a passos largos, que sejam observados e assimilados, com isenção, os fundamentos básicos de qualquer abordagem técnica – o quê mudar, por que mudar, como, quando e onde mudar.