O entendimento de frente e fundo de
lote está vinculado, do ponto de vista da Legislação, à
localização da via de acesso de veículos à unidade imobiliária.
Se um lote tiver duas ou mais divisas margeadas por vias de
circulação de veículos, será considerada como divisa frontal do
lote aquela de menor dimensão. A via de circulação de veículo
frontal a esta divisa será, então, a via de acesso.
A distinção entre frente e fundo
de uma edificação reveste-se de algumas diferenças em relação
aos critérios atribuídos ao lote: a frente da edificação pode não
ser coincidente com a frente do lote.
Um lote margeado por duas vias de
circulação de veículos pode ter a frente da edificação, o mesmo
que fachada principal ou frontal, voltada para a via por onde não
ocorre o acesso de veículos. Situação semelhante pode acontecer se
o lote tiver uma lateral voltada para a área pública, caracterizada
como área verde e/ou local de circulação de pedestres, quando a
fachada frontal pode estar voltada para esta área. Em ambos os
casos, esta possibilidade deve ser admitida pela Legislação de Uso
e Ocupação do Solo aplicável ao lote, que também determinará a
obrigatoriedade, ou não, do acesso de veículos ocorrer,
exclusivamente, através da divisa frontal do lote, aquela de menor
dimensão.
Nas cidades brasileiras,
lamentavelmente, as edificações sempre tiveram marcas precisas
quanto à caracterização de frente e fundo, circunstância
vinculada ao Programa Arquitetônico Culturalmente instalado.
A frente de uma residência
unifamiliar é sempre reservada a zona social, para onde se voltam
a sala de estar, a garagem e quartos. A zona de serviços relega-se
ao trecho posterior da residência, onde se constroem a cozinha, a
lavanderia, depósito, e outros compartimentos úteis e
imprescindíveis, mas que não devem compor a fachada principal.
A frente é dedicada ao
ajardinamento, ás calçadas e paredes de revestimento esmerado. Ao
fundo, em geral invisível a quem chega ou passa, pouca atenção é
dispensada. Em muitas circunstâncias, amontoam-se tranqueiras ao
lado de varais, tanques e depósitos de lixo, transformando áreas de
trabalho e de extrema importância funcional e vital em algo a
esconder, incompatível com a aparência socialmente valorizada da
frente da edificação.
Mas esta tendência não é restrita
às habitações unifamiliares.
Nas grandes cidades podemos
encontrar a noção de frente e fundo bem demarcada em habitações
coletivas. Em bairros nobres da Zona Sul do Rio de Janeiro, as
fachadas voltadas para avenidas de considerável renome são tratadas
como poses de cartão postal, enquanto os encontros de fundos de duas
ou mais edificações voltam-se para áreas livres descobertas,
dotadas de guarda-corpos que transpassam a visibilidade de áreas de
serviço, com tratamento arquitetônico capaz de desorientar quanto a
se estar na mesma edificação que se viu para frente.
O princípio urbanístico que
norteou a construção do Plano Piloto de Brasília quebrou a
identificação frente/fundo tanto nas edificações destinadas às
habitações unifamiliares localizadas nas quadras 700 Norte e Sul,
quanto nas habitações coletivas nas duas asas.
As residências das quadras 700,
geminadas e com 100% de ocupação do lote, têm as fachadas
denominadas frontais voltadas para as áreas verdes. Por onde não
pode ocorrer o acesso de veículos.
Contíguas a estas frentes, conforme
exigido pelo primeiro Código de Edificações de Brasília, era
obrigatório a construção de uma sala e um quarto.
Os compartimentos localizados no
trecho posterior da edificação, também por obrigatoriedade eram a
garagem e o quarto.
Além destes requisitos, onde se
incluía, ainda, a existência de um grande prisma de iluminação e
ventilação (com dimensionamento pré-definido), para atendimento
aos quartos, cozinha e área de serviço com janelas para ele
voltadas, era obrigatório o tratamento adequado do fundo da
edificação, de modo a não se diferenciar, em qualidade, do
tratamento dado a fachada frontal.
As edificações iniciais destinadas
às habitações coletivas, construídas entre os anos 50 e 80,
diferentes de quaisquer outras até então construídas no Brasil, se
caracterizaram por prismas de base retangular, sobre pilotis,
pousados sobre o solo verde e distanciadas entre si de modo
considerável.
Nestas edificações, a frente e o
fundo tiveram tratamento diferenciado, de forma a adequar-se às
funções dos compartimentos contíguos. A frente foi tratada por
esquadrias envidraçadas de grandes dimensões, para atendimento de
sala e quartos, enquanto o fundo foi, todo ele, protegido
externamente por cobogós em toda a extensão da fachada, como
anteparos às janelas nas áreas de serviço e cozinha.
Para este fundo também foram
lançadas as torres de circulação vertical, ocupando área além do
limite da projeção, caracterizadas como prismas de base retangular,
visualmente encostados na edificação principal. Por suas
consideráveis dimensões o acesso de veículos é vinculado ao
ordenamento da circulação e não ao posicionamento da frente da
projeção.
Aparentemente, pouco se entendeu a
respeito do sutil tratamento dado às edificações erguidas naquele
período. Não demorou muito a se avolumarem as pressões pelo
acréscimo de unidades domiciliares nas habitações coletivas, que
de vazadas passaram a dispor de apenas uma fachada, a frontal, para
onde se voltam a maioria dos compartimentos, inclusive cozinhas e
áreas de serviço, sempre em ambiente único para facilitar o acesso
à iluminação e ventilação. Estas soluções se repetem não
apenas no Plano Piloto, mas em outras cidades do Distrito Federal.
Nas soluções mais elaboradas, as áreas de trabalho se localizam em
reentrâncias pouco visíveis, resultantes do mecanismo da
compensação de área.
Nas habitações unifamiliares,
localizadas nas outras cidades do DF repetiram, em inúmeros casos, a
mesma trajetória brasileira do fundo menosprezado. Em muitas
localidades, ou em quase todas, as áreas livres posteriores à
edificação possibilitaram a construção dos lamentáveis “barracos
de fundo”, a serviço de ganhos financeiros extras por meio do
aluguel, repetição perversa das vilas encontráveis em cidades mais
antigas.
Não se trata de enaltecer soluções
arquitetônicas associadas a classes sociais mais privilegiadas, nem
posicionamento nostálgico em relação ao passado. A reflexão sobre
o antigo e inadequado descaso com o fundo das edificações e
contrapô-lo à noção de que o tratamento do fundo pode ser
diferente, mas que em nada pode dever ao tratamento dado a frente
talvez contribua, pelo menos em parte, para a valorização funcional
e estética da obra arquitetônica em sua totalidade. Infelizmente,
nem sempre é possível proceder como as plantas que, em sua profunda
grandeza, enraiza os seus serviços.
https://fbcdn-sphotos-e-a.akamaihd.net/hphotos-ak-prn1/45072_510964898928137_1508526250_n.png
ResponderExcluirPARABÉNS DOUTORA HILMA PELA GRANDE PESSOA E GRANDE AMIGA QUE VC É. OBRIGADO.
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