quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Guará – As Transformações Urbanas e os Desvios de Perspectivas.

                

            Núcleo urbano criado para  atender a demanda por moradias de população de menor renda,  o Guará,desde a sua implantação até a década de 1990, transformou-se em cidade consideravelmente adensada, onde muitos dos antigos moradores cederam espaço para uma população de classe média e média alta.
            A razão desta mudança é a sua localização geográfica de centralidade em relação a vários núcleos urbanos do trecho centro-sul do Distrito Federal, entre eles o Plano Piloto e Taguatinga.
            A proposta urbanística original do Guará previa terrenos de grandes dimensões, denominados Áreas Especiais, destinados aos usos industrial, comercial e institucional. Esta providência foi de extrema positividade sob o ponto de vista da possibilidade de oferta de postos de trabalho e serviços que reduziriam significativamente a dependência em relação ao Plano Piloto. Esta característica foi acentuada pela inclusão, em seu perímetro de abrangência, das áreas do Setor de Garagens e Concessionárias de Veículos (SGCV).
            Contudo, a mesma centralidade que promoveu a atração de moradores, removeu a perspectiva de sua independência.
            No início da década de 2000, foi criado o Polo de Modas, destinado à implantação de indústrias e comércio complementar. Mas, desde as primeiras construções ali erguidas, foi transformado em local de amontoado de quitinetes, desvio fomentado pela grande demanda por unidades habitacionais.
            Curiosamente, não foram observadas, à época, as distorções ocorridas na vizinha QE 40, área anterior ao Polo de Modas, onde projeto semelhante  de implantação de atividades geradoras de emprego, renda e serviços resultou, identicamente, em numerosas quitinetes irregulares.
            A partir de Dezembro de 2006, a legislação urbanística do Guará foi substituída pelo Plano Diretor Local (PDL). Instrumento que deveria representar um avanço na forma de uso e ocupação do solo, visando o bem estar da população, o PDL apresentou-se como um desmotivador de  qualquer perspectiva da cidade tornar-se autossuficiente.
            Novamente, a mesma centralidade, aliada à qualidade de vida até então existente e ao esgotamento das projeções destinadas ao uso habitacional coletivo no Plano Piloto, concentrou no Guará o foco  da solução para a carência de unidades habitacionais de média e alta renda.
            Os lotes das Áreas Especiais e do SGCV foram, então, destinados ao uso habitacional coletivo. As alturas das edificações e o número de pavimentos foram extraordinariamente acrescidos, em total desrespeito à horizontalidade construtiva preexistente.
            Entretanto, um elemento surgiu para impor freios à crescente desfiguração da cidade – A Portaria 68/2012 – IPHAN, instrumento Federal que abrangeu o Guará na poligonal de entorno da área tombada.
            A partir desta legislação, as alturas e o número de pavimentos foram significativamente reduzidos. No SGCV, a altura máxima não poderá ultrapassar o limite de 12m, com até 4 pavimentos. Nas outras áreas, a altura passou a ser de, no máximo, 34m, com 10 pavimentos, e dependente da cota de altitude do local.
            A  Legislação de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), por sua vez, observou o determinado pela Portaria do IPHAN, reduzindo drasticamente as alturas e o número de pavimentos.
            Ao mesmo tempo, a LUOS limitou o remembramento de lotes, exigiu áreas verdes internas  a estas unidades e determinou afastamentos mínimos obrigatórios em relação às divisas. Além disso, impôs restrições à construção de mais de uma edificação em mesmo lote. Todos estes aspectos eram, no PDL, ora discutíveis e ora omissos.
            Mas, apesar da LUOS, o prejuízo já se instalou. As Áreas Especiais e os lotes do SGCV permanecem como de uso habitacional coletivo. Aliás, a maioria deles encontra-se em processo construtivo ou com obras concluídas.
            O adensamento populacional do Guará já se implantou, apesar da insuficiência do seu sistema viário para a demanda que em pouco tempo será gerada. Muito provavelmente, haverá problemas com abastecimento de água e fornecimento de energia, questões que além de incômodas exigirão consideráveis investimentos públicos que poderiam ser utilizados em obras e serviços de melhoria de condições, e não para corrigir erros cometidos.

            Obviamente, o crescimento e o desenvolvimento das cidades é algo não só obrigatório, mas sobretudo salutar. A estagnação e o engessamento levam à morte qualquer sistema, inclusive o urbano. Mas desde que  as transformações atendam, coletivamente, às necessidades e aspirações de seus habitantes.

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